quinta-feira, 29 de julho de 2010

Refletindo antes, durante e após o processo: a prática reflexiva.

"Ninguém pode ver-se a si próprio num espelho, sem se conhecer previamente, caso contrário não é ver-se, mas apenas ver alguém". Kierkegaard, Soren Aabye

Partir da mesma indagação feita por Perrenoud no capitulo 1 do livro A prática reflexiva no ofício de professor: profissionalização e razão pedagógica inicia o trilhar para compreender a visão do educador sobre a relevância da reflexão na formação do professor:

Será que “refletir” é apenas pensar no que faremos, fazemos e fizemos?

Primeiramente, Perrenoud afirma que a reflexão pressupõe certa exterioridade, isto é, uma distância da ação pedagógica, portanto, é necessário que ela exista antes, durante e após o processo. Colocar-se fora, dentro da sua prática pedagógica aproxima o educador dos objetivos que lhe competem no processo de ensino aprendizagem. Além disso, para que ela se configure deve ser crítica e analítica relacionando teorias e práxis de maneira permanente.

Crítica porque é a através da prática reflexiva que julgaremos e apreciaremos nossa ação identificando os aspectos negativos e positivos. Analítica porque examinaremos seu todo e suas partes buscando entender cada passo e cada etapa.

Através desta prática reflexiva durante distante ou sobre a ação é possível ao profissional fazer um balanço de sua ação, compreender o que deu ou não certo, angariar experiências dentro dos prós e contras, guiar as decisões, questionar os processos envolvidos dentro da práxis entre outros.

A partir de seus registros, das trocas constantes com aqueles que fazem parte do processo de educar (alunos, instituição, parceiros) que os erros necessários ao crescimento serão vistos e revistos.

A reflexão traz uma renovação diária de saberes e fazeres além de propiciar manutenções ou mudanças nas nossas dinâmicas de relações em grupos ou organizações. Trazendo a responsabilidade e a autonomia necessária para o ofício de professor. Um professor que reflete deixa de ser principiante e se torna ator e autor de sua profissão.

É importante firmar que ser educador não é apenas uma vocação. Educar se confirma na ação do ofício de ser professor.

Profissão é a atividade ou ocupação especializada, ou seja, o professor faz da educação seu oficio, seu trabalho, seu meio de subsistência. Como profissional da educação cabe ao professor refletir buscando aperfeiçoar e melhorar a sua prática e seus conhecimentos.

Atualmente o mundo se constitui muito diferente de anos, décadas atrás, cabe ao professor em sua prática reflexiva atualizar-se para que desta forma tenha a sua disposição uma ação pedagógica inovadora, contemporânea que abarque os conhecimentos necessários a inserir o sujeito nesta sociedade. Deve ter uma visão ampla, informatizada, e generalizada.

Há inúmeros fatores motivadores para a reflexão; problemas a resolver, crise a solucionar, decisões a tomar, ajustes, auto-avaliações, reorganizações, construção de saberes, trabalho em equipe, entre outros.

A reflexão mostra-se como uma maneira de ver, sentir, agir e ser no mundo. Em alguns momentos ela aparece episódica. Um determinado fato a desencadeia; conflito, indisciplina, dificuldades de aprendizagem, entrevistas com pais, discussão em grupo, etc. Sendo assim, observa-se que todo sujeito é passível de uma reflexão, uma reflexão muitas vezes ocasional e que estimula ações empíricas.

Dentro deste pressuposto, impõe-se a relevância de uma prática reflexiva metódica, regular, e instrumentalizada que trará tomada de consciência e mudanças da práxis pedagógica.

Perrenoud (2002), afirma:

“Uma prática reflexiva não é apenas uma competência a serviço dos interesses do professor, é uma experiência da consciência profissional. Os professores que só refletem por necessidade e que abandonam o processo de questionamento quando se sentem seguros não são profissionais reflexivos.” (pg.50)

Desenvolver esta prática suscita uma aprendizagem sobre os benefícios que esta reflexão trará ao profissional. Novas condutas surgem atreladas a este refletir. Não refletimos apenas sobre o como, mas sobre o porquê optamos por certas ações, resoluções e decisões.

Sua essência deve estar preenchida de muito trabalho e disponibilidade; para que exista de forma instrumentalizada deve ser cultivada com leituras, formações e saberes acadêmicos ou profissionais construídos por outros. (Perrenoud, 2002)

Durante a nossa ação diária, nos planejamentos, trabalhos em equipes, workshops entre outros aprendemos a refletir sobre os aspectos relevantes de nossa prática.

Torna-se essencial que o profissional desenvolva em si autoconfiança, competências em múltiplos saberes (um ser interdisciplinar), capacidade de discernimento e antecipação.

A partir de nossa competência reflexiva assumiremos os desafios e as escolhas feitas dentro do nosso ofício, transformando nossos questionamentos em problemas para que posteriormente os resolvamos através de nossos saberes ou de métodos.

A prática reflexiva insere o profissional no mundo em uma relação ativa e não passiva aos acontecimentos que o circunda. Para uma ação mais equilibrada e tranqüila o profissional deve identificar o que compete ou não dentro de seu oficio e é através desta reflexão que esta percepção será aguçada. Desta forma ele poderá aumentar sua capacidade de inovar, de ousar e de dar mais sentido e contexto ao seu trabalho dentro da instituição em que atua.

Um profissional que reflete dentro de uma prática instrumentalizada é um profissional capaz de fazer inferências e legitimar ou não suas ações e prioridades. Deve ter o hábito de duvidar, de fazer perguntas, de levantar hipóteses, de debater, de questionar. Apresentar uma postura reflexiva.

Perrenoud (2002) afirma que:

“A prática reflexiva é uma relação com o mundo: ativa, crítica e autônoma; ela não pode ser desvinculada do conjunto da prática profissional, isto é, ela não é específica, nem um componente autônomo. Ela favorecesse a instalação de esquemas reflexivos, pois, uma parte da ação pedagógica é feita de urgência e improvisação, por meio da intuição sem apelar a conhecimentos.” (pág.65)

Uma das funções da prática pedagógica é permitir que o profissional tome consciência de seus esquemas e, quando eles são inadequados fazer com que evoluam. Quando incorporamos, interiorizamos o nosso saber fazer obtemos desta forma o domínio prático da ação.

Um profissional reflexivo sai de cima de um paradoxo pedagógico entre a teoria e a prática e assume de forma verdadeira a sua profissionalização; saber analisar constantemente sobre si mesmo, sobre suas questões implícitas, sobre sua cultura, sobre suas teorias, sobre sua relação com os outros, sobre suas formas de ação e reação; sobre o que ocorre dentro da sala de aula e na instituição escola, nos registros pedagógico, didático, sociológicos, antropológico, psicológico e psicanalítico. (Perrenoud, 2002)

É necessário que durante a prática o profissional tenha a capacidade de compreender e interpretar as situações sui generis que se apresentam dentro das diferentes esferas do processo educativo.

Mais do que especificidades o educador deve dominar a totalidade das situações que se apresentam. A prática docente possui uma importância fundamental dentro da estrutura de uma sociedade. Os professores através dela, formam e influenciam sujeitos co-participantes desta prática.

Perrenoud coloca (2002)

“Uma prática reflexiva não é uma prática específica nem um componente autônomo do ofício de ser professor, como o planejamento de uma seqüência didática, a moderação de um conselho de classe, o trabalho a partir do erro dos alunos ou a realização de procedimentos de projeto. A prática reflexiva não pode ser desvinculada do conjunto da prática profissional.” (pág.72)

Isto significa que somente um professor reflexivo conseguirá formar novos professores reflexivos.

Um profissional da área da educação detém o avanço e o retrocesso de nossa sociedade, além de contribuir ou não com o desenvolvimento de Homens críticos e de participação ativa nas decisões do grupo social que interagem.

É indispensável, portanto, profissionais que compreendam, conheçam o mundo de seus educandos, a sua linguagem, suas vivências e experiências e através de seus esquemas reflexivos, contextualize dentro de todo processo de aprendizagem situações que possibilitem significar os saberes formando-o globalmente.

Como afirma Perrenoud (2002),

“Um componente central de uma prática reflexiva: a capacidade de ir e vir do particular para o geral, de encontrar formas de interpretação teórica para explicar uma situação singular, bem como de identificar com rapidez incidentes críticos ou práticas que permitam desenvolver ou questionar uma determinada hipótese. “ (pág. 114)

A reflexão pode ter como principal objetivo fornecer ao professor informação correta e autêntica sobre a sua ação, as razões para a sua ação e as consequências dessa ação; mas essa reflexão também pode apenas servir para justificar a ação, procurando defender-se das críticas e justificar-se. Assim, a qualidade e a natureza da reflexão são mais importantes do que a sua simples ocorrência.

Através da prática reflexiva há um ganho na compreensão e esta nova compreensão pode fazer surgir um insight sobre o que significa ser professor, ou seja, o que significa ser um profissional da educação. Uma prática reflexiva proporciona aos professores oportunidades para o seu desenvolvimento, tornando-os profissionais mais responsáveis, melhores e mais conscientes.

Como aponta Perrenoud (2002), a prática reflexiva deve estar baseada nas competências profissionais:

1. organizar e estimular situações de aprendizagem

2. gerenciar a progressão das aprendizagens

3. conceber e fazer evoluir dispositivos de diferenciação

4. envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho

5. trabalhar em equipe

6. participar da gestão da escola

7. informar e envolver os pais

8. utilizar as novas tecnologias

9. enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão

10. gerenciar sua própria formação contínua (Perrenoud, 1999 a)


Um profissional reflexivo está inserido dentro da reflexão, ele aceita fazer parte do problema e reflete sobre sua própria relação com o saber, com as pessoas, como o poder, com as instituições. A prática reflexiva faz parte de sua rotina e está baseada não somente em momentos solitários, mas em troca informais ou formais.

Inserir uma prática reflexiva é um convite como coloca Perrenoud (2002, pág.198) a construção de seus próprios procedimentos em função dos alunos, da prática, do ambiente, das parcerias e cooperações possíveis, dos recursos e limites próprios de cada instituição, dos obstáculos encontrados e previsíveis.

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